O Pentateuco e a cristologia - Ministério Ligonier
Por que a cristologia é importante?
abril 17, 2024
Cristologia nos Livros Históricos e Salmos
abril 22, 2024
Por que a cristologia é importante?
abril 17, 2024
Cristologia nos Livros Históricos e Salmos
abril 22, 2024

O Pentateuco e a cristologia

Muitas pessoas, quando ouvem o nome Jesus Cristo, presumem que Cristo é o sobrenome de Jesus, assim como Silva, Couto ou Marques. Mas a palavra em português “Cristo” é simplesmente uma transliteração da palavra grega christos, que foi usada na tradução grega do Antigo Testamento hebraico para traduzir a palavra Mashiach ou Messias. Portanto, quando ouvimos o nome Jesus Cristo, não devemos pensar em Cristo como um sobrenome, mas como um título. Quando dizemos “Jesus Cristo”, estamos dizendo “Jesus Messias”.

Saber disso nos ajuda a entender como podemos falar de uma teologia de “Cristo” do Antigo Testamento, embora o próprio Jesus Cristo não apareça em carne e osso até os evangelhos do Novo Testamento. Podemos falar de uma cristologia do Antigo Testamento, pois o Antigo Testamento contém inúmeras promessas, profecias, sombras e tipos que apontam para a vinda do Messias: para a vinda do Cristo. Não examinaremos todos esses textos, mas nos concentraremos em alguns dos mais importantes. Se quisermos entender quem é esse Messias, precisamos ter algum entendimento desses textos.

Gênesis 3

O primeiro indício de um tema messiânico no Antigo Testamento surge na trágica consequência da queda. Adão e Eva confiaram na palavra da serpente em vez da Palavra de Deus, e a resposta de Deus é rápida. Depois de confrontar o homem e a mulher, que tentam transferir a culpa (Gn 3:8-13), Deus pronuncia Seu julgamento primeiro sobre a serpente, depois sobre a mulher e, por último, sobre o homem (vv. 14-19). Ele pronuncia uma maldição sobre a serpente (v. 14), porém no processo de pronunciar essa maldição, Deus faz uma promessa que dá à humanidade motivos para ter esperança. A queda do homem resultou na necessidade de redenção divina, uma necessidade que Deus aborda de imediato. Ele declara à serpente: “Porei inimizade entre ti e a mulher, entre a tua descendência e o seu descendente. Este te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar” (Gn 3:15).

Esse versículo tem sido frequentemente chamado de protoevangelho, ou o primeiro evangelho. É a graça e a misericórdia em meio à rebelião. Deus promete que haverá uma longa luta entre o bem e o mal, com a descendência (ou semente) da mulher enfim triunfando. Como o restante do Antigo Testamento e o Novo Testamento deixarão claro, esse triunfo virá através do Messias, Jesus Cristo.

A aliança abraâmica

O foco principal da história patriarcal (Gn 12–50) está nas graciosas promessas de bênção de Deus, promessas que são dadas primeiro a Abraão, depois a Isaque e, finalmente, a Jacó. A importância dessas promessas para a compreensão do restante das Escrituras não pode ser exagerada.

O chamado de Abrão em Gênesis 12:1-9 é um ponto crucial na história da redenção. Enquanto Gênesis 1–11 se concentra, em especial, nas terríveis consequências do pecado, as promessas de Deus a Abrão em Gênesis 12 se concentram na esperança da redenção, da bênção restaurada e da reconciliação com Deus. Deus vai lidar com o problema do pecado e do mal, e vai estabelecer Seu reino na Terra. Como Ele fará isso é algo que começa a ser revelado em Suas promessas a Abrão.

A seção principal de Gênesis 12:1-9 é o chamado explícito de Deus a Abrão encontrado nos vv. 1-3: 

Ora, disse o Senhor a Abrão: Sai da tua terra, da tua parentela e da casa de teu pai e vai para a terra que te mostrarei; de ti farei uma grande nação, e te abençoarei, e te engrandecerei o nome. Sê tu uma bênção! Abençoarei os que te abençoarem e amaldiçoarei os que te amaldiçoarem; em ti serão benditas todas as famílias da terra.

O tema do chamado de Deus a Abrão é evidente na repetição quíntupla dos termos-chave “abençoar” e “bênção”. O pecado do homem resultou na maldição de Deus (Gn 3:14, 17; 4:11; 5:29; 9:25), mas aqui Deus promete formar um povo para Si mesmo e restaurar Seus propósitos originais de bênção para a humanidade (veja Gn 1:28). De alguma forma, Abrão será o mediador dessa bênção restaurada.

O chamado de Deus a Abrão contém quatro promessas básicas: (1) descendência, (2) terra, (3) a bênção do próprio Abrão, e (4) a bênção das nações por meio de Abrão. A bênção prometida às nações da Terra é fundamental. A bênção de todas as famílias da Terra é o propósito principal por trás do chamado de Deus a Abrão. Seu chamado e as promessas que lhe foram dadas não são fins em si mesmos. Abrão recebeu a promessa de descendência, uma terra e bênçãos pessoais para que ele pudesse ser o mediador da bênção de Deus para todas as famílias da Terra. Como o restante do Antigo Testamento deixa claro, essa bênção virá por meio do estabelecimento do reino de Deus sob o Messias de Deus.

Gênesis 49

Quando Jacó se aproxima da morte, ele reúne seus filhos para pronunciar suas últimas palavras a respeito deles (Gn 49). Nesse momento, Jacó declara a seus filhos: “Ajuntai-vos, e eu vos farei saber o que vos há de acontecer nos dias vindouros” (Gn 49:1). O significado da frase “dias vindouros” ou “últimos dias” (ver Nm 24:14) deve ser determinado por seu contexto. Em geral, ela fala de um tempo futuro indeterminado. Jacó fala a todos os seus filhos, porém são suas palavras a Judá que são as mais importantes para a cristologia do Antigo Testamento. As palavras de Jacó a Judá antecipam a ascensão do rei davídico e muito mais.

Em Gn 49:10, Jacó diz: “O cetro não se arredará de Judá, nem o bastão de entre seus pés, até que venha Siló; e a ele obedecerão os povos.” Esse versículo é considerado por alguns como a primeira profecia messiânica explícita no AT. A tradução exata das palavras “até que venha Siló” é controversa devido à ambiguidade do hebraico, mas há um consenso geral de que a profecia aponta para a ascensão da monarquia davídica. A ideia principal das palavras de Jacó a Judá é que o cetro, um símbolo de realeza, pertenceria à tribo de Judá até a vinda daquele a quem esse status real de fato pertence. No AT, essa profecia é a princípio cumprida em Davi. No NT, ela é plena e finalmente cumprida em Jesus Cristo, o filho de Davi e o Leão da tribo de Judá (cf. Mt 1:1; Ap 5:5).

Êxodo

Em sua primeira Epístola aos Coríntios, o apóstolo Paulo afirma a seus leitores que “Cristo, nosso cordeiro pascal, foi sacrificado” (1 Co 5:7). Encontramos o contexto para essa afirmação no livro de Êxodo. Em Êxodo 12, Deus dá a Moisés as instruções para a cerimônia da Páscoa que distinguirá Israel do Egito. Deus expressa a Moisés que esse mês será agora o primeiro mês do ano para Israel (v. 2). Essa noite comemorará o nascimento de Israel como nação. Cada família deve pegar um cordeiro sem defeito e guardá-lo até o décimo quarto dia do mês, quando ele deverá ser morto (vv. 3-6). O sangue do cordeiro deve então ser colocado nas ombreiras e na verga das portas das casas, e as famílias das casas devem comer a carne assada do cordeiro (vv. 7-11). Deus revela a Moisés que nessa noite Ele passará pelo Egito e matará os primogênitos dos egípcios, porém passará por cima das casas marcadas com o sinal do sangue do cordeiro (vv. 12-13). O cordeiro da Páscoa se torna um substituto de Israel, o filho primogênito de Deus (cf. 4:22). Como tal, é um tipo do Messias vindouro, quem também morre como substituto de Seu povo.

Levítico

O significado messiânico de Levítico pode não parecer evidente à primeira vista, mas quando lembramos que o NT descreve Cristo como nosso Sumo Sacerdote (Hb 8-9) e como o sacrifício único pelo pecado (Hb 10), a relevância de Levítico se torna mais óbvia. A santidade que Deus exige de Seu povo é explicada no livro de Levítico, onde as leis referentes aos sacrifícios e ao sacerdócio são apresentadas em detalhes. Os sacrifícios proporcionavam um meio para que o povo de Israel fosse purificado quando cometia pecados, e os sacerdotes que ofereciam esses sacrifícios eram mediadores entre Deus e Seu povo. Tanto o sacerdócio quanto os sacrifícios apontavam para uma realidade maior que viria na pessoa e na obra de Jesus, o Messias.

Números 24

Uma das profecias messiânicas mais intrigantes encontramos em Números 22–24, na história de Balaão. Quando começamos a história, Israel acampou nas planícies de Moabe, e Balaque, o rei de Moabe, teve grande medo (22:1-4). Como consequência, ele convoca Balaão, um profeta pagão da Mesopotâmia, para amaldiçoar os israelitas (vv. 5-8). No entanto, Deus não permite que Balaão amaldiçoe Israel, mas ordena que ele abençoe Israel. Nos caps. 23-24, para a consternação de Balaque, Balaão profere quatro oráculos de bênção sobre Israel. O quarto oráculo é particularmente notável. Balaão prevê a vinda de um rei, porém essa vinda não será imediata: “Vê-lo-ei, mas não agora; contemplá-lo-ei, mas não de perto” (Nm 24:17). O Rei vindouro é descrito como uma estrela que sai de Jacó e um cetro que sai de Israel (v. 17; ver Gn 49:10). Esse Rei derrotará todos Seus inimigos (v. 18). Essa profecia se cumpriu inicialmente no reinado de Davi, mas seu cumprimento definitivo aguardava a vinda do Messias.

Deuteronômio 18

O estabelecimento do ofício profético é o tema de Dt 18:15-22. Depois de delinear as formas proibidas de tentar conhecer a vontade de Deus (vv. 9-14), Moisés passa a explicar a natureza da profecia, o meio legítimo pelo qual Deus comunicaria Sua palavra ao Seu povo (vv. 15-22). Ele declara ao povo: “O Senhor, teu Deus, te suscitará do meio de ti, de teus irmãos, um profeta como eu; a ele ouvirás” (Dt 18:15). Aqui Deus prevê a continuação do ofício profético após a morte de Moisés.

Contudo, é importante lembrar que Moisés era único entre os profetas como ministro da aliança de Deus (Nm 12:6-8; Dt 34:10-12). Como veremos, a mensagem dos profetas posteriores estava enraizada na aliança mediada por Moisés. Jeffrey Niehaus explica: 

O ministério profético era de dois tipos: o profeta como mediador da aliança (apenas Moisés); o profeta como mensageiro do processo de aliança (profetas subsequentes). Deus havia levantado o profeta Moisés para mediar Sua aliança com Israel. Ele levantaria outros profetas para instaurar uma ação de aliança: chamar o povo à obediência da aliança ou anunciar as punições da aliança decorrentes de sua desobediência.

A promessa de Deus de levantar outro profeta como Moisés foi posteriormente entendida pelos israelitas como uma profecia messiânica (Jo 1:21, 45; 6:14; 7:40). Por fim, essa promessa profética aponta para Jesus, o único Mediador da nova aliança (cf. At 3:20-22).

Conclusão

Esta breve pesquisa de certos textos messiânicos no Pentateuco não tem a intenção de ser exaustiva. Jesus indica que todo o Antigo Testamento diz respeito a Ele (Lc 24:27). Nós apenas arranhamos a superfície. Em nossa próxima postagem, examinaremos várias profecias e promessas nos Livros Históricos, nos Salmos e nos Profetas.

Disse o Senhor ao meu senhor:
Assenta-te à minha direita,
até que eu ponha os teus inimigos
debaixo dos teus pés.

O Senhor enviará de Sião o cetro do seu poder,
dizendo: Domina entre os teus inimigos.

Apresentar-se-á voluntariamente o teu povo,
no dia do teu poder;
com santos ornamentos,
como o orvalho emergindo da aurora,
serão os teus jovens.

O Senhor jurou e não se arrependerá:
Tu és sacerdote para sempre,
segundo a ordem de Melquisedeque.

O Senhor, à tua direita,
no dia da sua ira, esmagará os reis.

Ele julga entre as nações;
enche-as de cadáveres;
esmagará cabeças por toda a terra.

De caminho, bebe na torrente
e passa de cabeça erguida
(Salmos 110).

Este artigo faz parte da coleção Introdução à cristologia ortodoxa.

Publicado originalmente em Ligonier.org.

Keith A. Mathison
Keith A. Mathison
O Dr. Keith A. Mathison é professor de Teologia Sistemática no Reformation Bible College em Sanford, Flórida. Ele é autor de vários livros, incluindo The Lord’s Supper [A Ceia do Senhor] e From Age to Age [De era em era].