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Os dons de revelação cessaram?

Nota do Editor: Este é o último de 16 capítulos da série da revista Tabletalk: Atributos de Deus mal compreendidos.

Ainda existem dons de revelação do Espírito Santo hoje? Em outras palavras, Deus ainda dá a certas pessoas a habilidade única de profetizar e falar em línguas para dar novas revelações?

Para a questão se os dons de sinais de revelação cessaram com o encerramento da era apostólica, a resposta bíblica, teológica e histórica tem que ser sim.

Biblicamente, Hebreus 1:1-2 enfatiza a finalidade da revelação em Jesus Cristo como vindo depois da obra dos profetas e registrada no Novo Testamento pelos apóstolos. A questão da profecia e sua conexão com as Escrituras é fundamental para o cristão. Houve um contexto pactual de revelação e profecia no Antigo e no Novo Testamento que deve moldar a forma como vemos esta questão. Ao longo das Escrituras, a profecia está associada a um ministério público e é responsável perante a Palavra de Deus.

Teologicamente, o fato de que o Filho é “o resplendor da glória e a expressão exata do seu Ser” (Hb 1:3) não deixa dúvidas de que o ápice da profecia termina na pessoa e na obra de Cristo. Não há profecia maior a acrescentar, nenhuma revelação especial adicional, como declara a advertência de Apocalipse 22:18-19. Jesus Cristo declara perto da conclusão de Seu ministério terreno que o Espírito Santo é o Consolador “a quem o Pai enviará em meu nome”, que “vos ensinará todas as coisas e vos fará lembrar de tudo o que vos tenho dito” (Jo 14:26). Aqui vemos que a obra do Espírito Santo entre o povo de Deus se dá por meio da aplicação dos benefícios da obra realizada por Cristo em nosso favor, em nosso entendimento e em nossa vida. A obra do Espírito Santo entre o povo de Deus envolve regenerá-los e chamá-los em resposta ao evangelho por meio da fé em Cristo, tantos quantos foram dados pelo Pai ao Filho. Nos crentes individuais, desta obra regeneradora do Espírito surge consolo e ousadia do testemunho interior de que a Palavra de Deus é verdadeira, que a obra de Cristo é em seu favor e que o Senhor nunca os deixará ou abandonará Suas promessas.

Agora, o que isso tem a ver com os dons de revelação ou dons de sinais? Bem, muito em todos os sentidos. No debate sobre continuísmo e cessacionismo, as pessoas podem perder de vista o fato de que todos os cristãos acreditam que o Espírito Santo está ativo agora, ao criar fé em todos os que o Senhor chamou para Si por meio do ministério do evangelho. Não há debate entre os crentes se o Espírito Santo está em ação, a questão é como. Esse ponto não deve ser esquecido, mesmo quando cristãos e igrejas diferem.

Dado que o pentecostalismo é um dos maiores movimentos do cristianismo nos séculos XX e XXI, é encontrado em todos as ramificações do protestantismo e do catolicismo romano e é uma questão inevitável em missões globais, minha resposta negativa à pergunta acima pode ser uma surpresa. Há um amplo espectro entre os cristãos contemporâneos que defendem tudo, desde uma forma de continuísmo até o cessacionismo. O continuísmo em sua visão mais forte é a afirmação de que os dons de revelação são marcas necessárias, constitutivas e contínuas da presença do Espírito Santo na igreja e nos indivíduos crentes. Nesta forte visão continuísta, igrejas, e mesmo cristãos professos sem pelo menos alguns desses dons de sinais, podem muito bem ser falsas igrejas e falsos cristãos. Ou, para afirmar positivamente, os continuístas enfatizam que a vibração da igreja é evidenciada pela obra contínua do Espírito Santo manifestada em indivíduos com dons reveladores como falar em línguas e profetizar continuamente.

Quando se trata do espectro de pontos de vista continuístas, tornou-se comum, se não estiver na moda, nos círculos cristãos de hoje, afirmar um continuísmo brando que sanciona em princípio todo o seu espectro no púlpito e nos bancos. Embora ainda possa haver objeção em igrejas continuístas brandas à plena prática dos pontos de vista pentecostais de dons de revelação no culto público, a objeção não seria em princípio, mas apenas em bases pragmáticas ou prudentes do que é melhor para o culto público.

Por outro lado, o cessacionismo é a visão de que os dons de revelação eram para a era dos apóstolos durante sua vida e cessaram com o fechamento do cânon das Escrituras. Assim, para os cessacionistas, a ênfase principal é a cessação da totalidade da Sagrada Escritura com o encerramento da produção do Novo Testamento. Além disso, nas Escrituras, a invocação de “uma palavra do Senhor” ou falar “uma palavra profética em nome do Senhor” não permite margem para erro. Por exemplo, Dt 18:21-22 afirma claramente:

Se disseres no teu coração: Como conhecerei a palavra que o Senhor não falou? Sabe que, quando esse profeta falar em nome do Senhor, e a palavra dele se não cumprir, nem suceder, como profetizou, esta é palavra que o Senhor não disse; com soberba, a falou o tal profeta; não tenhas temor dele.

A importância deste ponto não pode ser exagerada. Os verdadeiros profetas do Senhor e Suas palavras por meio deles não admitem profecias falíveis. Além da finalidade bíblica e teológica da revelação de Deus em Cristo mencionada antes, é importante notar que, juntamente com uma robusta doutrina da inerrância e infalibilidade da Escritura, a posição cessacionista sustenta requisitos igualmente elevados de veracidade, precisão e infalibilidade da verdadeira profecia.

O continuísta, embora reivindique uma obra mais completa do Espírito no Novo Testamento, tem que manter uma visão menos completa ou menor da profecia do que ocorreu no Antigo Testamento. Alguns continuístas muito convictos — mas certamente não todos — podem argumentar pela equivalência de sua revelação privada com as Escrituras, até mesmo referindo-se a si mesmos como apóstolos atuais. É verdade que tal afirmação faz com que a maioria dos continuístas, quer tenham formas modificadas ou brandas de visão, se contorçam, e com razão. Por quê? Por um lado, a maioria dos continuístas deseja inserir uma diferença crítica entre o nível e a prioridade da inspiração apostólica e da profecia pós-apostólica. Podem permitir que um dom profético e revelacional pós-apostólico do Espírito Santo seja falível. Vamos aprofundar a questão por um momento: entre aqueles na órbita carismática, nem toda palavra do Senhor dada por alguém dotado de profecia pós-apostólica é de fato verdadeira ou deve-se esperar que seja absolutamente verdadeira. Pode vir a ser em grande parte verdade. Pode ser provável. Pode não acontecer de jeito nenhum. Pode refletir apenas uma impressão extática pretendida como verdadeira. Mas não pode ser considerado como absolutamente verdadeiro à primeira vista. Por implicação, um sinal contínuo da verdadeira presença do Espírito Santo na igreja e, por extensão, nos crentes, é reduzido a um sinal falível e passível de prova. Uma verdadeira profecia do Espírito Santo pode estar errada? Claro que não. Se uma prática de “profecia” falível surgisse na prática de uma igreja, ela não tenderia, na prática e nos princípios, a uma visão inferior das Escrituras?

Além dos argumentos sobre os dons de sinais no Novo Testamento, acredito que seria muito mais proveitoso discutir o que é com frequência chamado de iluminação. Deve-se afirmar que iluminação não é o mesmo que revelação. A revelação é a verdade objetiva que aponta para Deus. Entre os teólogos reformados clássicos do século XVI em diante, a inspiração é muitas vezes definida em relação à inspiração do profeta ou apóstolo e em relação à inspiração das Escrituras. É neste domínio que a discussão da profecia como revelação especial é mais fiel e apropriada. A iluminação é uma confirmação do Espírito Santo a alguém sobre a veracidade das Sagradas Escrituras. Para o crente recém-regenerado, Cristo é compreendido com fé no coração e entendimento na mente. Para um crente estabelecido, a obra de iluminação do Espírito Santo edifica a fé e o entendimento nas Sagradas Escrituras com o objetivo de maturidade e santidade cristã. 

A doutrina da iluminação entre os reformados é a visão de que é preciso uma obra do Espírito Santo para entender as Escrituras de uma maneira salvífica para que os eleitos sejam chamados à vida eterna. Para ser exato, iluminação não é revelação. A doutrina da iluminação procura explicar como o Espírito Santo aplica as Escrituras no coração de um crente para produzir convicção de pecado, arrependimento, fé e uma nova inclinação para a obediência. O testemunho interno do Espírito Santo é um aspecto muito importante da vida cristã quando percebemos, à luz da Palavra de Deus, por exemplo, que temos a obra confirmadora do Espírito Santo de Deus encorajando nossos corações a confiar nEle, que fomos adotados na família de Deus e que temos acesso a Deus por meio de Cristo para orar com ousadia e liberdade. A doutrina da iluminação significa que podemos e devemos orar para que o mesmo Espírito Santo que inspirou as Escrituras resplandeça em nossos corações para que possamos conhecê-las e conhecer a Deus como Ele deve ser conhecido: como nosso Deus fiel, Salvador, Aba Pai, Rei e Senhor, como a fonte e base de toda a nossa alegria. E enquanto ansiamos e desejamos uma adoração maior e mais completa a Deus com todo o povo de Deus no céu, aqui nesta vida recebemos as Escrituras suficientes e autorizadas para treinar, guiar e dirigir nossos corações e mentes a Deus.

Este artigo foi publicado originalmente na Tabletalk Magazine.

Todd M. Rester
Todd M. Rester
O Dr. Todd M. Rester é professor associado de História da Igreja no Westminster Theological Seminary. É tradutor da Petrus Van Mastricht’s Theoretical-Practical Theology.