
Amor, justiça e ira
outubro 27, 2023
Onipotência
novembro 1, 2023Onipresença

Nota do Editor: Este é o sexto de 16 capítulos da série da revista Tabletalk: Atributos de Deus mal compreendidos.
A onipresença de Deus é fundamental para a maneira como o experimentamos. A onipresença é a maneira como percebemos o ser infinito de Deus. Ser infinito é ser sem limites, e ser sem limites é ser “onipresente” em nossa percepção. Estamos restritos pelo espaço e pelo tempo, mas dentro dessas limitações podemos conhecer a presença de Deus conosco. Nossas circunstâncias mudam, mas sentimos que Ele está sempre próximo. Este é o ensinamento do Salmo 139:7-10; Jeremias 23:23-24 e Romanos 8:38-39. Nada no céu ou na terra pode nos separar do amor de Deus, de modo que onde está o Seu amor, ali Ele está. Em termos de nossa caminhada diária com Deus, podemos entender a importância disso. Se Deus não estivesse presente e disponível quando precisássemos dEle, Suas promessas de nos salvar e nos defender soariam vazias e haveria algo defeituoso em nosso relacionamento. Como poderíamos confiar nEle se não soubéssemos onde Ele estivesse? É verdade que alguns cristãos se perguntam onde está Deus no meio do sofrimento, e muitos falaram da “noite escura da alma” quando parece que Deus está longe e se esqueceu de nós. Esta é uma experiência espiritual genuína, e não devemos descartá-la ou subestimar seu significado.
No entanto, a Bíblia nos diz que quando sentimos que Deus está longe de nós, o problema está conosco e não com Ele. Podemos ter fechado nossas mentes para Ele. Deus pode ter deixado de falar conosco, por motivos que só Ele sabe. Andamos pela fé, não pelo que vemos, e há momentos em que nossa fé é testada até o limite. Mas isso não significa que Deus não esteja presente em nós e entre nós. Deus pode estar trabalhando nas profundezas de nossas vidas das quais não temos conhecimento consciente. Ele está nos moldando e nos direcionando em níveis de nosso ser que ultrapassam nossa compreensão, e pode ser que apenas mais tarde que descobrimos que Ele tem trabalhado em nós apesar de nós mesmos. Até mesmo Jesus se sentiu abandonado na cruz (Mt 27:46; Mc 15:34), mas sabemos que Seu Pai estava lá com Ele e que, no fim de Seu sofrimento, Jesus se entregou aos cuidados amorosos de Seu Pai (Lc 23:46). O que era verdade sobre a presença de Deus com Ele também é verdade sobre a presença de Deus conosco, mesmo que não possamos percebê-la no momento.
Como a onipresença de Deus realmente funciona? Algumas pessoas pensam que Ele está presente em tudo e que tudo, de alguma forma, faz parte dEle. Isso pode ser chamado de “panteísmo”, que é a afirmação de que tudo é divino, ou mais sutilmente, “panenteísmo”, que é a crença de que Deus infunde tudo sem que seja uma extensão de Seu próprio ser. Semelhante a isso é a crença, defendida por alguns, de que Deus é como o ar, ou uma espécie de gás, que permeia o mundo e cuja presença pode ser sentida, mesmo que não possa ser explicada ou percebida por nossos sentidos.
O problema essencial com abordagens desse tipo é que elas não entendem ou explicam a distinção entre o ser de Deus e a natureza de Sua criação. Deus não fez o mundo como uma extensão de Si mesmo e não o permeia de forma alguma. O Criador é totalmente diferente de tudo o que Ele fez, e Sua natureza não é como a natureza de Sua criação. Mesmo as criaturas espirituais (anjos e demônios), que se assemelham mais a Deus do que o universo material, são finitas e, nesse sentido, são bem diferentes dEle. Como seres humanos, temos contato com Deus não por causa de nossa criação, mas porque fomos feitos à Sua imagem e semelhança (Gn 1:26-27), o que nos diferencia do resto da ordem criada. Somos obrigados a usar conceitos finitos para falar sobre Ele, pois nossas mentes são finitas, mas sabemos que quando o fazemos estamos falando por analogia. Dentro dos limites de nossa estrutura conceitual, podemos dizer que Deus é “como” isso ou aquilo, mas, em última análise, Ele é bem diferente e infinitamente superior a qualquer elemento que possamos imaginar.
Mais problemáticas são as numerosas afirmações na Bíblia, sobretudo no Antigo Testamento, que afirmam que Deus colocou Seu nome em certo lugar, que implica que Ele está de alguma forma presente ali em maior grau do que em qualquer outro lugar. Encontramos essas afirmações não apenas no Pentateuco (Êx 20:24; Dt 12:5), mas também nos Livros Históricos (2 Cr 6:6) e nos Profetas (Hc 2:20). Muitas vezes, se referem a Jerusalém, a cidade onde Deus colocou Seu nome, especialmente ao templo. Habacuque, por exemplo, afirma de modo claro que o Senhor está em Seu santo templo e que toda a terra deve se calar diante dEle.
Como devemos entender isso? Isaías 66:1 nos lembra que o templo não pode conter Deus, portanto, se pensássemos nesses termos, isso contradiz Habacuque. A interpretação com certeza deve ser que Deus designou certos lugares, e em particular o templo, como lugares onde Sua presença abençoada habitaria de modo especial, onde Ele deveria ser adorado por Seu povo e onde responderia a eles. Não porque Ele não estivesse igualmente presente em outro lugar, mas porque as pessoas precisavam ter um lugar para se reunir e concentrar sua adoração. Isso ainda se aplica hoje. Nos reunimos na igreja não porque Deus está presente lá e ausente em outro lugar, mas porque precisamos ter um ambiente que todos reconheçam ser dedicado à adoração a Deus. É para nosso benefício e para dar testemunho aos que estão ao nosso redor que fazemos isso, não porque Deus esteja presente em um lugar e não em outro.
As palavras que usamos refletem as habilidades conceituais limitadas de nossas mentes, não a realidade do ser de Deus. Ele parece ser onipresente para nós nas dimensões de tempo e espaço porque Ele é infinito em Seu ser eternamente transcendente. Sua onipresença (como a percebemos) é a expressão externa e prática de Sua infinitude, que se destina a fazer sentido para nós sem diminuir o ser incompreensível de Deus.
Este artigo foi publicado originalmente na Tabletalk Magazine.